Sentença judicial em primeira instância determina indenizações equivalentes a quase cinco anos de salários a 27 jornalistas
por Cláudio Soares
Quase cinco anos de salários. Isso é o que a Justiça do Trabalho determinou como indenização a cada um dos 27 jornalistas demitidos em 2017 pelo Portal R7, da Rede Record, em retaliação por terem realizado uma greve. A decisão judicial de primeira instância, divulgada em março, acolheu os argumentos apresentados em ação movida pelo Sindicato dos Jornalistas (SJSP).
O juiz Fábio do Nascimento Oliveira, da 50ª Vara do Trabalho de São Paulo, reconheceu que houve dispensa discriminatória e identificou abuso de poder da empresa. Como avaliou que a reintegração ao trabalho é inviável, determinou que os demitidos recebam indenização correspondente ao dobro de seus salários desde o dia seguinte à dispensa até a data de publicação da sentença. Decidiu também que devem receber indenização por danos morais individuais, no valor de cinco salários. O total chega a pelo menos 59 salários para cada pessoa.
A greve de 2017 teve início após uma decisão arbitrária do Portal R7, que comunicou aos cerca de 60 jornalistas, no dia 30 de novembro, a mudança de escala de folgas em vigor. Em vez da escala 3×1, com um fim de semana trabalhado e três de folga, seria adotada a escala 2×1, o que aumentaria a carga de trabalho. Diante da recusa dos representantes da empresa em discutir o assunto, os profissionais paralisaram as atividades, descendo até a calçada em frente à Record para debater coletivamente a questão.
O SJSP dispôs-se a negociar com a empresa, que se recusou a receber os dirigentes sindicais e ainda demitiu um jornalista. No dia seguinte, mais dois profissionais foram dispensados. O diretor de Recursos Humanos da Record comprometeu-se, então, a debater as escalas com o sindicato, caso houvesse o retorno ao trabalho. Isso foi aceito pelos jornalistas, mas não apenas a Record manteve a recusa à negociação como demitiu mais quatro profissionais.
No dia 15 de dezembro, a empresa convocou reunião dos jornalistas, ao fim da qual 20 deles foram orientados a permanecer no local. Eles foram demitidos coletivamente, de forma vexatória, em retaliação evidente ao movimento.
Alvaro Magalhães, que era editor de Cidade no R7 e foi dispensado, enfatiza o caráter espontâneo do movimento, em que os jornalistas começaram a conversar sobre uma medida que consideravam prejudicial e da qual a empresa não abria mão: “Na Redação, éramos um grupo heterogêneo. Ao longo da paralisação, esse grupo foi se consolidando, porque queríamos algo em conjunto. Um dos maiores aprendizados foi enxergar como uma greve se forma, independentemente da ideologia das pessoas”.
Provas consistentes
No processo judicial, a Record argumentou que as demissões já estavam planejadas e decorreram de reestruturação do trabalho, sem relação com a greve. A sentença do juiz refutou essa tese, com base em provas e depoimentos colhidos.
Os demitidos, que durante a tramitação do processo fizeram da Praça Roosevelt um local informal de reuniões, comemoraram muito o resultado. “A maior alegria no primeiro momento é a vitória moral. Ainda não é uma vitória material, por ser decisão de primeira instância”, afirma Magalhães.
De acordo com o coordenador jurídico do SJSP, Raphael Maia, “mesmo que ainda caiba recurso, foi uma grande vitória, uma vez que o juiz fundamentou sua decisão em inúmeras e consistentes provas da retaliação promovida pela Record. Isso traz grande expectativa de que a decisão seja mantida nas instâncias superiores”.
Para Paulo Zocchi, presidente do SJSP, o resultado reforça a importância do sindicato, “que esteve ao lado dos trabalhadores desde o primeiro momento, até o fim”. Zocchi destaca ainda a união, a coragem e a coesão dos jornalistas do R7, “um verdadeiro exemplo para toda a categoria”.
A sentença pune a Record também por danos morais coletivos, pelo “abuso de direito praticado em razão do poder econômico, cujas consequências atingem não apenas os dispensados”. A empresa tem de pagar indenização de R$ 200 mil ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
E a escala de folgas no R7? Passados dois anos e meio, Alvaro Magalhães observa que foi mantida a escala 3×1. “A gente se uniu e conseguiu impor um limite ao achatamento de direitos que já vinha acontecendo na empresa”, conclui.