Traço livre por Elifas Andreato (22/1/1946 – 29/3/2022)

Esta obra precisa ser vista com vagar. É preciso examinar cada detalhe e descobrir o porquê de cada um. É necessário conhecer um pouco da história recente do Brasil e do que se passou na espanhola Guernica como preparativos da 2a Guerra Mundial. Também é necessário saber quem é o autor desta tela e as circunstâncias que a levaram a existir, publicamente, a partir de 25 de outubro de 1981.

Nesse ano, Hermínio Bello de Carvalho foi curador de uma exposição promovida pela Funarte e patrocinada pela IBM. Cem artistas plásticos brasileiros foram convidados a celebrar o centenário de nascimento de Pablo Picasso (nascido em 25/10/1881) criando um trabalho inspirado nele. Elifas Andreato foi um deles.

Quando descobre a coincidência de datas de nascimento do homenageado com o assassinato do seu amigo Vladimir Herzog (25/10/1975), veio o estalo. “Por seis anos seguidos, amargurei a angústia de lembrar sua morte por meio da foto farsante do Vlado enforcado, como se fosse um suicida. Resolvi repor a verdade histórica e pintei este quadro, que denuncia como ele e tantos outros foram mortos pela ditadura. Sofri muito para concluir este 25 de Outubro. Fui o último dos artistas a entregar a encomenda.

O salão já estava montado. Por isso, só havia um lugar para ser exposto: na entrada do evento. O representante da IBM, quando viu o trabalho, determina ao Hermínio que excluísse da mostra essa ‘Guernica Brasileira’, para que a empresa não tivesse problemas com o governo. E Hermínio responde: ‘Como curador, posso dizer: façam o que quiserem com os outros 99. Este fica!’” E ficou.

Em tempo: Elifas doou para o Sindicato o 25 de Outubro/Guernica Brasileira, entronizado no auditório Vladimir Herzog. Uma reprodução foi confeccionada como mosaico pelas crianças da escola Projeto Âncora, de Cotia, instalada, em 2013, no Muro das Evocações da Praça Memorial Vladimir Herzog. •

Texto: Sérgio Gomes