Prêmio Vladimir Herzog 2020: Edição tem recorde de inscritos e novo prêmio

Neste ano, em que a liberdade de expressão e tantos jornalistas foram atacados, o prêmio que reconhece trabalhos sobre direitos humanos e democracia, avaliou mais de mil trabalhos

por Adriana Mendes

A 42ª edição do Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos foi um marco. Com mudanças estruturais, recorde de inscrições e a criação de um novo prêmio, a organização trabalhou de forma remota, assim como também foram realizadas a premiação e a roda de conversa entre os vencedores. Foram adaptações necessárias em tempos tão caóticos e incertos de pandemia por covid-19.

Considerado um dos mais significativos do País, o Prêmio Vladimir Herzog reconhece, desde a sua primeira edição, em 1979, trabalhos que valorizam a democracia e os direitos humanos.

Presidente Viral: Foco nas expressões de Bolsonaro para traduzir sua presença em manifestação, em plena pandemia. Foto de Gabriela Biló/O Estado de S. Paulo, menção honrosa no Prêmio Vladimir Herzog

Essa edição contou com número histórico de inscrições. Foram 1.060 produções, divididas em seis categorias: artes (ilustrações, charges, cartuns, caricaturas e quadrinhos), fotografia, produção jornalística em texto, produção jornalística em vídeo, produção jornalística em áudio e produção jornalística em multimídia. Em 2020, os ataques aos direitos humanos, liberdade de expressão e democracia foram recorrentes e intensos. O recorde de material inscrito mostra como os profissionais da comunicação trabalham arduamente para manter os direitos adquiridos e denunciar todos os ataques sofridos, vindos até mesmo do governo federal.

A organização também criou uma premiação específica para esta edição, concedida a uma ação realizada por 109 chargistas, em defesa da liberdade de expressão, personificada na figura de Aroeira, que teve uma charge criminalizada pelo poder estatal. Os ilustradores fizeram uma charge continuada e a comissão organizadora resolveu criar o Prêmio Destaque Vladimir Herzog Continuado, reconhecendo esse esforço criativo, de denúncia pela arte, e solidário de outros profissionais. “Vai criminalizar o Aroeira? Me criminaliza também” – foi a mensagem dada pelas 109 peças inscritas por artistas do traço, integrantes do movimento da Charge Continuada #SomosTodosAroeira.

“E daí?” Charge de Duke, menção honrosa no Prêmio Vladimir Herzog 2020, manifesta a indignação pelo descaso com a humanidade

Menção honrosa
“É uma charge que não tem humor, não faz brotar o riso”, define o chargista Duke, que recebeu menção honrosa pelo trabalho E daí?.

Duke conta que, normalmente, no processo criativo costuma descartar a primeira ideia e buscar outras formas de expressar a opinião. “Em relação àquele fato já me veio a imagem do Bolsonaro em cima de uma montanha de mortos dizendo: ‘E daí?’. Uma charge que revela nossa indignação, a nossa revolta diante do descaso pela vida, pela ciência, pela humanidade, uma charge que apenas retrata um momento tão triste do nosso país”, completa o artista.

A repórter fotográfica Gabriela Biló, do jornal O Estado de S. Paulo, quando soube que haveria uma manifestação com a presença do presidente, em plena pandemia, resolveu seguir o presidente o dia inteiro. “Era um absurdo aquela multidão, no meio de uma pandemia, eu tive medo de me contaminar, usei todas as medidas de proteção, mas estava ali, exposta”, conta Gabriela, que queria registrar uma imagem emblemática de Bolsonaro e deixou sua lente focada nele, o tempo inteiro. E assim fez a foto (menção honrosa) Presidente viral, o momento exato em que ele tosse e revira os olhos, sem máscara, com a mão na boca. “Acho que o fotojornalismo é isso, você conseguir traduzir a sua intenção, o que você pensa e sente, numa imagem”, completa.

Essas histórias e os relatos dos bastidores das reportagens, ensaios fotográficos e charges estão em vídeos, gravados por todos os finalistas. A roda de conversa entre os vencedores pode ser conferida no site www.premiovladimirherzog.org, assim como todos os trabalhos dos finalistas.

Prêmio Especial
Desde 2009 as instituições promotoras retomaram a proposta original do prêmio, que previa homenagear a cada edição personalidades ou jornalistas com atuação destacada no período, assim como pelos relevantes serviços prestados às causas da democracia, paz, justiça e direitos humanos. Os homenageados desta edição são a cartunista Larte, uma das mais importantes artistas do traço do Brasil; a filósofa Sueli Carneiro, referência nos estudos sobre raça e gênero; e o jornalista Luiz Gama (in memoriam), ativista incansável na luta contra o regime escravocrata.

Nessas últimas quatro décadas já foram homenageados Lourenço Diaféria (in memoriam), David de Moraes, Audálio Dantas, Elifas Andreato, Alberto Dines, Lúcio Flavio Pinto, Perseu Abramo (criador do prêmio, in memoriam), Marco Antônio Tavares Coelho, Raimundo Pereira, Sandra Passarinho, Rubens Paiva (in memoriam), Mino Carta, Mauro Santayana, Daniel Herz (in memoriam), Eduardo Galeano (in memoriam), Elio Gaspari, Cláudio Abramo (in memoriam), Tim Lopes (in memoriam), D. Paulo Evaristo Arns (in memoriam), Rose Nogueira, Bernardo Kucinski, Patrícia Campos Mello, Glenn Greenwald e Hermínio Sacchetta (in memoriam). ■