Memória: Elifas Andreato: operário, artista, jornalista

por Sérgio Gomes

Um dos principais artistas brasileiros, Elifas teve presença destacada em grandes revistas do país e na imprensa alternativa de oposição à ditadura militar / Foto: Wilson Dias – Agência Brasil

Este ano, o Dia do Jornalista foi comemorado na Praça Memorial Vladimir Herzog, que Elifas Andreato desenhou com os próprios pés no já distante 23 de abril de 2011. Ali, estão quatro obras emblemáticas de sua autoria.

Neste dia 9 de abril, o ponto alto foi uma eleição. Por unanimidade, jornalistas, artistas e estudantes de jornalismo decidiram que, a partir de agora, aquele espaço junto à Praça Vladimir Herzog denomina-se Centro Cultural a Céu Aberto Elifas Andreato, palco de futuras apresentações.

Essa foi uma das formas encontradas de converter a profunda tristeza detonada pelo seu falecimento, no dia 29 de março, em celebração da vida deste que foi um dos principais artistas brasileiros.

Nascido em Rolândia, Paraná (1946), numa família de lavradores, muda-se com a família para São Paulo em 1958 e torna-se aprendiz de torneiro mecânico na Fiat Lux, fábrica de fósforos, em 1960.

Ali, publica os primeiros desenhos no jornal interno, cria cartazes de prevenção de acidentes e pinta painéis que decoravam o salão da fábrica nos bailes de sábado.

Em 1965, abandona esse emprego para dedicar-se à carreira artística, tornando-se assistente de cenografia do programa Luiz Vieira na TV Record. Em 1967, é contratado pela Editora Abril, onde passa pelas revistas Quatro Rodas, Veja e Realidade e participa da criação de Placar. Em 1969, passa a colaborar com jornais de oposição ao regime militar, chegando a imprimir, em mimeógrafo na sua própria casa, o clandestino Libertação.

Desenha as primeiras capas de disco em 1972: Dança da Solidão, de Paulinho da Viola, e Batuque na Cozinha, de Martinho da Vila.

Elifas ainda integrou a direção de jornais da imprensa alternativa: Opinião, Movimento e a revista Argumento. Colaborou com o teatro, através de cartazes e cenografia. Muro de Arrimo, com direção de Antonio Abujamra, rendeu-lhe o primeiro dos muitos prêmios nas artes cênicas.

Conquistou três campeonatos seguidos como carnavalesco da Camisa Verde e Branco. Ganhou o Grande Prêmio da Canção Ibero-americana em Washington, em parceria com Jessé. Cenografou e produziu o programa Som Brasil, com a apresentação de Lima Duarte, na Globo, e projetou a Praça Antonio Prado, no centro de São Paulo. Construiu uma parceria de vida inteira com Rolando Boldrin.

E tem mais. Muito mais.

A quem tiver interesse em conhecer mais profundamente seu legado, sugiro o livro Vai, DJ!, de João Rocha Rodrigues, Editora Palavras, que foi lançado dia 9 de abril no Centro Cultural a Céu Aberto Elifas Andreato e chega agora às livrarias. É dele que tiramos a citação de Elifas abaixo.

“Meu maior orgulho – maior do que qualquer prestígio é capaz de alcançar – é poder dizer que minha arte se liga à história da minha vida, das vidas assemelhadas à minha, e serve para contar o que eu e pessoas semelhantes a mim entendemos que seja o mundo, a justiça e a liberdade.

Nunca tive a pretensão de saber tudo. Mas sempre estive atento às coisas que a vida podia ensinar, já que mal pude frequentar uma escola. Entretanto, foram muitos os mestres que me deram a mão nessa trajetória. O jornaleiro na Vila Anastácio que, ainda que não tivesse um tostão no bolso, permitia ao garoto folhear revistas que lhe revelaram o mundo. A assistente social que conseguiu ver uma fagulha de talento no aprendiz de torneiro mecânico e o convidou a fazer a decoração das festas da fábrica. Os companheiros do jornalismo que acolheram o capiau que mal sabia ler e lhe apresentaram a realidade do país. Sem falar da turma da música, do teatro, da televisão. Foram tantos….

Mas, hoje, gostaria de lembrar da contribuição dos que estavam no chão de fábrica, por assim dizer: operários como fui um dia”