Por Paulo Zocchi
Por duas décadas, no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, não houve quem não conhecesse João Montenegro Filho. Seja como sindicalizado atuante, diretor da entidade ou integrante da oposição, Monte se expressava com paixão e firmeza, e não fugia dos debates. Suas marcas pessoais eram o companheirismo e a generosidade. Todos gostavam muito dele.
Nascido em 1960, Montenegro formou- -se na Cásper Líbero em 1980. Iniciou sua carreira em jornais de bairro na capital. Trabalhou depois na rádio Independente e no jornal O Diário, de Barretos, na rádio Cultura e na Folha de Guaíra. De volta à capital, atuou na rádio Globo-Excelsior de 1986 a 1989 e na TV Cultura em 1988. No final de 1988, ingressou na TV Globo, onde ficou por 23 anos, em boa parte do tempo na chefia de reportagem.
Filiou-se ao Sindicato dos Jornalistas em 1988. Na época, o presidente era Robson Moreira, que se dedicou a renovar a entidade, buscando jovens jornalistas conscientes e atuantes nas redações. Essa foi uma das marcas da gestão seguinte (1990-1993), presidida por Antônio Carlos Fon, que contou com Montenegro como diretor, e incorporou uma leva de novatos da editora Abril, do Diário Popular, da Folha de S.Paulo, do Estadão, da editora Projeto, da Imprensa Oficial e muitos outros locais, da capital e interior.
Sempre atuante, Montenegro integrou delegações do Sindicato neste período aos congressos da CUT. Estávamos ainda no início do período de desregulamentações do trabalho e da economia, no governo Collor. Com hiperinflação, a luta sindical não parava. Ao final da gestão, houve uma divisão: Monte foi candidato a vice-presidente por uma das chapas concorrentes, que não venceu.
Num período de demissões em massa, houve fortes movimentos de resistência na base da categoria. A situação levou à união de forças, e uma chapa única apresentou- -se às eleições de 1997, com Montenegro integrando a Executiva, como diretor de Sindicalização. É fundamental ressaltar seu papel como elo entre os jornalistas da Globo e o Sindicato por mais de duas décadas. Hoje, o maior contingente de sindicalizados está na Rede Globo de Televisão, e parte importante disso é uma grata herança deixada por Montenegro, incansável organizador dos colegas e construtor do Sindicato desde a base.
Há nova cisão no final da gestão 1997- 2000, com Montenegro integrando o grupo de diretores(as) que se opunham à criação pelo Sindicato de um plano de saúde baseado no caixa da entidade (que, anos depois, mostrou-se catastrófico). Integra assim as chapas de oposição de 2000, 2003 (candidato a presidente) e 2006. Mesmo fora da diretoria, manteve atuação intensa nas atividades sindicais e na representação dos colegas da Globo, onde participou também da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa).
João Montenegro era um profissional admirado. Na Globo, trabalhou a maior parte do tempo na chefia da madrugada. Explicava, com bom humor, que, nesta função, era fundamental ter uma avaliação precisa da importância das notícias: quando acordar o chefe às 3 horas da manhã, e, também muito importante, quando não acordar. Um erro poderia ser fatal!
Em empresas que estimulam a concorrência entre os pares, defendia e praticava um jornalismo solidário, no qual a informação é um bem de interesse público, e os jornalistas da madrugada das TVs, rádios, jornais e revistas formavam uma confraria que se apoiava e colaborava para que ninguém ficasse para trás.
Por incrível que pareça, Montenegro tinha também uma personalidade tímida e reclusa. Saiu da Globo em 2011, e desde então buscou o recolhimento. Encontrou raramente os velhos amigos, compareceu ainda a algumas atividades sindicais.
Fumante inveterado, morreu em 6 de outubro de 2023, de um câncer no pulmão, com metástase em outros órgãos. Faltou ainda falar que tinha grande interesse pelos mais diversos esportes, assunto no qual era uma referência segura de informação para os colegas. Sua grande paixão era o Santos Futebol Clube, com cuja camisa foi enterrado.