Editorial: UM PÉ DENTRO, UM PÉ FORA

Querida leitora, querido leitor: o mês de outubro chegou, o calor (com ares apocalípticos) voltou, é hora de fazer as compras no supermercado, encontrar as primeiras caixas de panetone à venda e tomar aquele susto habitual. O ano de 2023 está chegando aos seus finalmentes! Para nós, que topamos encarar a missão de dedicar um período de nossas vidas representando a categoria na diretoria do Sindicato, há também a sensação de que o ano passou rápido demais. Mas não há muita chance para recostar-se na cadeira e ficar perdido em pensamentos com a “Retrospectiva 2023”. Afinal, o calendário sindical tem suas particularidades temporais que exigem um contínuo ciclo de mobilização.

Março é o mês de enviar a pauta de Jornais e Revistas. Junho, de iniciar a negociação com os patrões daquele segmento. Em outubro, é necessário enviar as reivindicações de Rádio e TV. Com a chegada de dezembro, encaramos a luta com as emissoras do estado. Nesse meio tempo, lidamos com demandas diversas, organizamos atividades e atos, fechamos acordos coletivos e negociações com dezenas de empresas e, semanalmente, realizamos uma reunião de diretoria para discutir as questões e avaliar como podemos avançar para a organização das e dos jornalistas de São Paulo. O calendário tem suas previsibilidades, mas cada dia conta com as suas surpresas. De tédio, sem dúvida, não padecemos!

O tempo exíguo para realizar grandes balanços e avaliações, entretanto, não impede de compartilhar uma sensação geral bastante evidente. O Brasil de 2023 nos permitiu resgatar a esperança de viver com democracia, respeito e solidariedade, após quatro anos de sacrifícios e de resistência diária diante do avanço da violência, do obscurantismo e do autoritarismo. Não se trata aqui de pintar um quadro idílico ou afirmar que todos os problemas da classe trabalhadora brasileira estão devidamente encaminhados e prontos para serem resolvidos. A explícita chantagem e coerção gestadas no Poder Legislativo e a abundância de governos estaduais e prefeituras comprometidas com uma agenda de destruição de direitos e do patrimônio público (a começar pelo estado de São Paulo, sob gestão de um bolsonarista de primeira hora) são provas concretas que há muito trabalho pela frente e muitas dificuldades e contradições a serem superadas.

Mas também é evidente que se abrem novas possibilidades quando a civilidade e o respeito voltam a patamares de normalidade. Desde o início do ano, mantivemos contato com representantes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para discutir questões como a emissão do registro de jornalistas e a regulamentação de nossa profissão (que não é atualizada desde 1979!). Em setembro, também tivemos uma reunião na Superintendência Regional do MTE para denunciar a intransigência patronal do Sindicato das Empresas Proprietárias de Jornais e Revistas no Estado de São Paulo (SindJori), que se recusa a negociar Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) há mais de um ano. Nessas conversas, o governo federal demonstrou preocupação com a situação da categoria e se colocou à disposição para interceder por negociações, embora necessite se reconstruir após anos de desmonte.

O BRASIL DE 2023 RESGATOU A ESPERANÇA DE VIVER COM DEMOCRACIA, APÓS QUATRO ANOS DE SACRIFÍCIOS E DE RESISTÊNCIA DIANTE DA VIOLÊNCIA, DO OBSCURANTISMO E DO AUTORITARISMO.

Com a mudança de conjuntura, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) reabriu a luta para que a Câmara dos Deputados aprove a PEC do Diploma: aprovada no Senado em 2012, o projeto determina o retorno do diploma de Jornalismo para o exercício profissional e está pronto para votação dos deputados desde 2015. Para entender melhor a questão, dedicamos a capa deste Unidade para uma conversa com a presidenta da Fenaj, Samira de Castro. Mais do que lutar por uma “reserva de mercado” ou realizar uma distinção entre diplomados e não-diplomados, a luta encabeçada por nossa federação sindical é uma maneira de valorizar a categoria, que há anos sofre com demissões, precarização, baixos salários e as tentativas de descredibilizar o trabalho da imprensa a partir da desinformação.

Para completar esse breve informe dos Poderes da República, no mês de setembro estivemos no Salão Branco do Supremo Tribunal Federal (STF) em audiência com equipe do ministro Alexandre de Moraes para requerer que o ex-presidente Jair Bolsonaro seja investigado no inquérito das milícias digitais, a partir dos sistemáticos ataques realizados contra jornalistas. Bolsonaro foi condenado judicialmente por danos morais coletivos à categoria, após uma ação movida por nosso Sindicato.

A mudança de governo, os convites aos palácios, às reuniões em ministérios e aos gabinetes parlamentares, entretanto, não podem mudar a maneira como lutamos para organizar e representar a nossa categoria, nem nos deixar desmemoriados a respeito de um dos fundamentos mais importantes do movimento sindical que realmente está disposto a lutar: a sua independência perante partidos, governos e o Estado. É por isso que é vital manter o “pé para fora” da institucionalidade, mesmo sabendo que o “pé para dentro” é importante em alguns momentos para a defesa das reivindicações da categoria.

É essa independência sindical, entretanto, que permite que possamos lutar livremente para fortalecer a comunicação pública brasileira. Neste ano, apesar de saudar as preocupações do governo federal em frear o desmonte da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), continuamos lutando por salários, direitos e concursos públicos, denunciando problemas e exigindo a valorização das e dos jornalistas.

As nuvens carregadas e o ar irrespirável de uma política de destruição e de morte começam a sumir do horizonte neste 2023. Mas para que elas não retornem, devemos manter nossas bandeiras erguidas, sem medo de mobilizar e reivindicar as mudanças necessárias para a dignidade de nossa categoria e toda a classe trabalhadora. Colocar abaixo as contrarreformas, formular políticas que deem conta das mudanças econômicas, sociais e culturais de nossa época, estruturar um futuro ambientalmente justo e viável. Eis as tarefas para os próximos anos. Da nossa parte, continuaremos na obstinada missão de dar protagonismo, voz e organização às e aos jornalistas paulistas. A luta continua!

Direção do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo