Com apoio da Cojira SP, Instituto Tebas lança web série Liberdade ou Morte: histórias que a história não conta

Documentário sobre Luiz Gama foi exibido no auditório Vladimir Herzog, dia 21 de junho, celebrando os 194 anos de nascimento do abolicionista negro

Claudia Alexandre (Cojira-SP)

O busto de Luiz Gama foi o ponto de partida da caminhada, que se encerrou no auditório Vladimir Herzog. Foto Paulo Pinto/Agência Brasil

Caminhada Luiz Gama Imortal, o primeiro episódio da web série Liberdade ou Morte: histórias que a História não conta, foi lançado no último dia 21 de junho, no auditório do SJSP. A programação teve início com um ato público no Largo do Arouche onde está localizado o busto do abolicionista Luiz Gama, nascido em 21/06/1830, seguido de uma caminhada até a sede do sindicato, onde ocorreu a exibição do vídeo para a celebração dos 194 anos de nascimento do homenageado. 

A web série tem realização do Instituto Tebas de Educação e Cultura (ITEC) e foi dirigida pelo antropólogo e documentarista, Alexandre Kishimoto, com textos do jornalista e coordenador do ITEC, Abílio Ferreira. O projeto foi financiado por emenda parlamentar da vereadora Luana Alves, executada pelo Farol Antirracista, política pública da Secretaria Municipal de Relações Internacionais de São Paulo (SMRI).  O evento contou com o apoio da Cojira SP – Comissão dos Jornalistas pela Igualdade Racial, do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo.

Liberdade ou Morte é composta por sete episódios, com narrativas distintas. Cada enredo tem referência crítica às programações do bicentenário da independência comemorado em 2022, razão pela qual reúne documentos, imagens, textos e depoimentos de representantes de movimentos sociais organizados e atividades que mostram outra realidade da história oficial. A história não contada e transformada em narrativas antirracistas compõe os episódios que estarão à disposição do grande público. Os outros seis títulos serão: Marcha Noturna Pela Democracia Racial; Cerco Indígena a Piratininga; Cortejo em Memória de Chaguinhas; Marcha das Mulheres Negras; Marcha do Dia da Consciência Negra e Movimento Mobiliza Saracura Vai-Vai.  

Todos os episódios ficarão disponíveis no site www.institutotebas.org.br, ao longo do segundo semestre de 2024, em datas a serem divulgadas na própria página.

A ideia principal é mostrar o protagonismo negro-indígena paulistano, no Triângulo Histórico de São Paulo e no Bairro da Liberdade, territórios considerados representativos das contradições do projeto de nação forjado a partir da Proclamação da Independência do Brasil. “Lançamos mãos dessas três linguagens – vídeo, foto e texto, para narrar de que maneira a agenda do movimento negro-indígena paulistano dialoga com o processo histórico de interpretação do Brasil, tendo como marco referencial o slogan do grito do Ipiranga, no dia 7 de setembro de 1822. As peculiaridades das três linguagens se articulam, mediadas por um conteúdo comum que é a agenda mencionada. Entretanto, caberá à narrativa textual explicar as relações existentes entre essa agenda e os acontecimentos ocorridos ao longo de dois séculos de fundação do projeto brasileiro de nação”, disse Abílio Ferreira. 

Cada um dos episódios é constituído de duas obras artísticas, isto é, duas abordagens diferentes do mesmo tema: um ensaio de imagens do fotógrafo João Leoci, combinado com uma crônica de autoria do escritor Abílio Ferreira; e um audiovisual de Alexandre Kishimoto. A direção musical é do cantor e compositor Aloysio Letra e a identidade visual foi criada pelo designer Danilo de Paulo.

A expressão “Liberdade ou Morte” remete ao lema da Revolução do Haiti (1791-1804), numa interpretação crítica do projeto de nação veiculado pelo grito do Ipiranga (Independência ou Morte), cujo bicentenário foi comemorado em 2022, em plena retomada das mobilizações coletivas pós-pandemia. Já o subtítulo “histórias que a História não conta” lembra um dos versos do emblemático samba-enredo da Mangueira História pra ninar gente grande, campeã do carnaval carioca de 2019.

Para os produtores, o projeto também tem a preocupação de dar acesso a um conjunto de informações acerca do protagonismo negro-indígena em locais de significação histórica e destacar a vocação educadora do movimento negro brasileiro, como um produtor de saberes emancipatórios e sistematizador de conhecimentos sobre a questão racial no Brasil, seguindo o pensamento da ativista e educadora Nilma Lino Gomes. 

No dia 17 de maio de 2018, a Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial, órgão do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, reconheceu Luiz Gama, oficialmente, como um integrante da categoria.

Caminhada Luiz Gama Imortal – Duração: 25 minutos

O primeiro episódio, que tem o título de Caminhada Luiz Gama Imortal, narra a celebração da memória do escritor, jornalista, advogado, líder abolicionista e republicano. Para se ter ideia do prestígio de Gama, ainda na São Paulo escravista do século XIX, basta lembrar que o seu funeral, realizado no dia 25 de agosto de 1882, mobilizou cerca de três mil pessoas (10% da população paulistana de então) de diferentes segmentos sociais e econômicos, que fizeram a pé todo o percurso de seis quilômetros, do bairro do Brás, onde ele morava, até o Cemitério da Consolação. 

A palavra “PROGRESSO” aparece na inscrição do pedestal do seu imponente busto. É o nome do jornal editado a partir de 1928, por integrantes do Movimento Negro jornalístico, literário e carnavalesco de São Paulo, com o objetivo de arrecadar recursos para confeccionar um busto em celebração do centenário de nascimento de Gama. O monumento foi instalado no Largo do Arouche, em novembro de 1931, com quase um ano e meio de atraso em relação à meta de 21 de junho de 1930, mas com grande mobilização da sociedade paulistana e ampla cobertura da imprensa. 

No dia 21 de junho de 1991, quase 60 anos depois dessa intervenção jornalístico-literária que invadira o Largo do Arouche pela primeira vez, um grupo de escritores ligados ao movimento da Literatura Negra Brasileira criou o projeto Rhumor Negro, para celebrar, em caminhadas anuais entre o Largo do Arouche e o Cemitério da Consolação, acompanhadas da declamação de poemas, a ousadia da poesia e do jornalismo satíricos de Luiz Gama, autor do livro Primeiras trovas burlescas de Getulino (1859), e criador, em 1864, junto com o desenhista italiano Ângelo Agostini, do Diabo Coxo, primeiro jornal humorístico ilustrado da história da imprensa paulistana.

A caminhada de Luiz Gama é feita com regularidade, ora comemorando o seu nascimento, em junho, ora celebrando a sua imortalidade, em agosto.