Abril cassou a liberação sindical sem prejuízo de vencimentos do presidente de nosso sindicato
Por Adriana Franco
José Américo e Leonardo Sakamoto (acima), Patrícia Zaidan, Juca Kfouri e Maria José Braga (ao meio), Eduardo Suplicy, Fernando Morais e Orlando Silva (abaixo) estão entre os que se posicionaram contra a decisão da Abril de exigir a volta de Paulo Zocchi ao trabalho, impedindo-o de exercer plenamente o mandato sindical
Nos últimos dois meses, as atividades do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) foram realizadas com muita dificuldade, depois que a Editora Abril convocou o presidente da entidade, Paulo Zocchi, que é seu funcionário, a voltar ao trabalho na empresa. O retorno se deu em 30 de outubro, encerrando cinco anos de liberação sindical sem prejuízo de vencimentos.
Desde então, as campanhas salariais e assembleias não contam com a dedicação exclusiva de Zocchi. As negociações salariais só tiveram a sua presença em virtude de cláusula existente na Convenção Coletiva de Trabalho que garante aos diretores do Sindicato a liberação de um dia por mês para a realização de atividades sindicais.
Zocchi é também vice-presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). Uma assembleia da categoria em outubro decidiu realizar a campanha #AbrilRespeiteoSindicato, para que a empresa volte atrás na medida antissindical.
Ataque ao SJSP
Jornalista sindicalizado, o vereador reeleito por São Paulo Eduardo Suplicy (PT) acredita que o presidente do Sindicato tem a atribuição de estar em contato com todos os jornalistas que representa e, para que possa exercer o mandato, a Abril precisa garantir-lhe esse direito. “A mim parece de bom senso que a Abril deva reconsiderar essa decisão, para que o conjunto dos jornalistas e todos os que trabalham na Editora Abril tenham um representante sindical que possa realizar de maneira bem feita o seu trabalho” afirma Suplicy.
A manifestação de Suplicy soma-se a outras que a campanha tem recebido de centrais sindicais (CUT e Força Sindical), parlamentares, sindicatos, entidades democráticas e redações. Seis ex-presidentes do SJSP encaminharam carta conjunta à Abril, e a atual presidente da Fenaj, Maria José Braga, também se somou à campanha.
O deputado estadual José Américo (PT), que também é jornalista, protestou na Assembleia Legislativa de São Paulo contra a atitude arbitrária da Editora Abril. “Em um ataque ao Sindicato dos Jornalistas – porque o Sindicato tem questionado [a empresa] pelas irregularidades trabalhistas –, a Editora Abril fez isso [cassou a liberação sindical] com o presidente Paulo Zocchi”, disse Américo.
O deputado federal Orlando Silva (PCdoB) posicionou-se no Congresso Nacional e por meio de moção enviada à Abril. Em vídeo que divulgou, afirma: “A medida atinge em cheio a capacidade de ação e organização da categoria, por isso registrei, na Câmara dos Deputados, uma moção de apoio à manutenção da liberação do Paulo Zocchi para o exercício do seu mandato sindical sem prejuízo de vencimentos e direitos até agosto de 2021”.
Nem na ditadura militar
Os jornalistas Fernando Morais, Juca Kfouri, Eugênio Bucci, Paulo Moreira Leite, Patrícia Zaidan e Leonardo Sakamoto foram alguns dos ex-funcionários da Abril que se expressaram. Seus depoimentos reforçam que a atitude da Abril teve caráter antissindical.
Para Fernando Morais, a empresa cometeu uma “barbaridade” ao impedir que o presidente do SJSP exerça seu mandato sindical, exigindo que Zocchi dê expediente. Segundo ele, a Abril não havia cometido tal ato nem mesmo durante a ditadura militar. Morais, ex-editor-assistente de Veja e ex-repórter especial da Playboy, foi vice-presidente do Sindicato na gestão de David de Moraes (1978-1981). “Isso é inadmissível e a categoria não pode aceitar”, reitera.
SEIS EX-PRESIDENTES DO SJSP ENCAMINHARAM CARTA CONJUNTA À ABRIL, QUE TAMBÉM RECEBEU MOÇÕES DAS CENTRAIS SINDICAIS CUT E FORÇA SINDICAL, SINDICATOS, REDAÇÕES E ENTIDADES DEMOCRÁTICAS
Juca Kfouri lembra que dois jornalistas da própria Abril, Audálio Dantas e David de Moraes, foram eleitos presidentes da entidade e liberados para cumprir o mandato sindical. Audálio presidiu o Sindicato de 1975 a 1978 e Moraes dirigiu a entidade em seguida.
O ex-secretário editorial da Abril, Eugênio Bucci, destacou o aspecto tradicional da liberação sindical na democracia brasileira e afirmou que “quando uma empresa se recusa a fazer a cessão do presidente do sindicato, estamos diante de, mais do que uma medida administrativa, uma medida coercitiva, de um veto e de um ato que pode ser caracterizado como uma interdição política”.
Paulo Moreira Leite, que atuou por 17 anos na empresa, afirmou que Abril “tenta perseguir o movimento sindical e atacar o resíduo de organização independente que se expressa através do antigo editor e atual presidente do Sindicato, Paulo Zocchi”. Patrícia Zaidan, em seu depoimento, classificou a medida da editora como “um boicote, uma rasteira contra os direitos dos trabalhadores e a nossa categoria”. Leonardo Sakamoto ressalta que o mandato de representação sindical é incompatível com o trabalho diário na redação. “Como alguém pode estar em negociações coletivas com patrões e em reuniões para garantir direitos dos trabalhadores das empresas de jornalismo sem um afastamento remunerado? O presidente tem o direito legal à estabilidade desde a sua eleição e, como ele tem o dever de representar, deve ser garantido a ele também a manutenção de seus vencimentos”, diz