por Luciano Medina
O Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, promoveu uma audiência pública no dia 22 de outubro de 2024 para prosseguir com as discussões e ações em reparação pela participação histórica do Banco do Brasil na escravização de pessoas negras no país. A audiência, bem como o inquérito civil público nº 4.372, de 2023, foi presidida pelo procurador da República no Rio de Janeiro Júlio José Araújo Junior, da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão.
O encontro foi realizado na perspectiva de encaminhar propostas e posições efetivas para o conjunto dos movimentos representativos presentes na audiência e para toda a sociedade brasileira. No entanto, o Banco do Brasil e as pastas governamentais não apresentaram formalmente uma posição capaz de responder às provocações contidas no inquérito civil público.
Histórico
Com o objeto “Tráfico de pessoas negras escravizadas e o Banco do Brasil: direito à reparação”, o inquérito foi aberto após notícia de fato subscrita por historiadores de diversas universidades, que apontaram a participação do Banco do Brasil no tráfico transatlântico e a necessidade de apuração e debate sobre a responsabilidade de instituições no Brasil envolvidas com a escravização de pessoas no século 19. O procurador Júlio Araújo destacou o pedido público de desculpas formulado pelo Banco do Brasil, em 18 de novembro de 2023. A instituição demonstrou disposição em construir um plano de ação que apontava compromissos como “potencializar, acelerar e ampliar iniciativas de políticas públicas para a produção e resultados concretos em prol da Igualdade Racial”. Em dezembro de 2023, o MPF realizou uma consulta pública no âmbito do inquérito civil para acolher propostas de reparação junto à sociedade civil. Cerca de 40 representações apresentaram mais de 500 propostas.
Audiência com BB e ministérios
Os representantes do banco João Alves e Nivea Mota anunciaram que a apresentação do plano de ação do banco aconteceria no dia 4 de dezembro. Ao longo da exposição, Alves falou sobre a inviabilidade de muitas das propostas apresentadas, e que algumas seriam “irreais”. “Para uma ação de reparação efetiva se faz necessário o envolvimento e mobilização do Congresso Nacional”, concluiu o representante do Banco do Brasil.

O BANCO DO BRASIL NÃO APRESENTOU UM PLANO DE AÇÃO CONCRETO NA AUDIÊNCIA PÚBLICA, O QUE GEROU FRUSTRAÇÃO NOS PROCURADORES E MOVIMENTOS SOCIAIS, QUE ESPERAVAM MEDIDAS EFETIVAS DE REPARAÇÃO
O Ministério da Igualdade Racial (MIR) se limitou a divulgar diversas ações da pasta, em paralelo ao objeto do inquérito, e se pôs em condição de escuta da sociedade civil presente com objetivo de coletar informações. O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) demonstrou posição semelhante e se restringiu a difundir iniciativas outras que não aqueles objetos do inquérito. A falta de posicionamento efetivo das pastas gerou frustração e críticas dos procuradores, que esperavam uma atitude mais concreta, dado o acúmulo de mais de um ano de tramitação do inquérito e o contato de todas as partes com o conteúdo. Decepcionado com a posição do Banco do Brasil e das pastas governamentais em razão do longo período de discussões existentes na ação de reparação, para Jaime, o pedido de desculpas não basta. “O simbolismo é importante, mas insuficiente”, disse.
Desdobramentos
A audiência em 22 de outubro de 2024 estabeleceu 4 de dezembro de 2024 para anúncio e apresentação do documento contendo o plano de ação com cronograma e previsão orçamentária para a reparação, segundo critérios internos de apuração e sistematização das informações. Para Julio Aráujo, todos tiveram um ano para a construção e acúmulos de posição e informação que pudessem materializar em ações concretas.
Passado o período, o Banco do Brasil não respondeu ao compromisso firmado na audiência pública. A ação da instituição se restringiu a uma participação de coadjuvante no programa do governo federal Pacto pela Igualdade Racial, liderado pelo MIR, em conjunto com o MDHC. O protagonismo através de ações de reparação efetivas que se esperava do banco, e que ainda se espera via inquérito civil, frustrou a sociedade civil e o próprio MPF. O descumprimento do prazo pela instituição financeira, além da falta de informação e de diálogo, mobilizaram a sociedade civil através das redes sociais, que encaminhou uma carta à instituição. Escrita pelo Movimento Negro Unificado, e subscrita por diversos movimentos, a carta reconhece as intenções do Pacto pela Igualdade Racial, mas julga as medidas insuficientes como instrumento para reparação.
Em resposta, o Banco do Brasil emitiu um ofício em que subscrevem seus advogados, argumentando o posicionamento frente às propostas e ao cumprimento do prazo que era uma promessa para o dia 4 de dezembro. De acordo com o BB, o Pacto pela Igualdade Racial inclui medidas que a entidade entende como parte do compromisso de reparação dentro do combate ao racismo.
O MPF recebeu a resposta do Banco do Brasil à carta enviada pelo movimento social e anexou ao inquérito. Os procuradores devem manifestar posição e tomar as medidas legais a partir de todo o conjunto probatório do inquérito. •