Assange por um fio, mas a luta continua!

Corte de apelação da Justiça britânica negou recurso contra sua extradição para os EUA

por Pedro Pomar

“Vejo com preocupação a possibilidade iminente de extradição do jornalista Julian Assange. Assange fez um importante trabalho de denúncia de ações ilegítimas de um Estado contra outro. Sua prisão vai contra a defesa da democracia e da liberdade de imprensa. É importante que todos nos mobilizemos em sua defesa.”

Essa límpida e contundente declaração do presidente Lula em 10 de junho último – no dia seguinte à malfadada decisão da penúltima instância de apelação da Justiça do Reino Unido de negar o recurso de Assange contra sua extradição para os Estados Unidos – é um alento para seus defensores. Apesar disso, a situação do jornalista australiano aprisionado há quatro anos em Belmarsh (Londres) tornou-se extremamente difícil após a decisão de apenas três páginas do magistrado da alta corte Jonathan Swift.

Swift rejeitou com uma “canetada” todas as razões apresentadas pela defesa de Assange contra a ordem de extradição, assinada em junho de 2022 por Priti Patel, à época ministra do Interior do governo britânico. Os advogados do jornalista anunciaram novo recurso que seria impetrado na mesma corte de apelações e apreciado por um painel de dois juízes, após audiência pública.

“Não será possível interpor mais recursos no nível nacional, mas Assange poderá recorrer ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem”, diz a ativista brasileira Sara Vivacqua. A seu ver, a decisão de Swift é “frontalmente ilegal” e parece indicar “uma tentativa dos juízes de evitar por todos os meios que o Supremo Tribunal britânico tenha de decidir o caso Assange, para assim evitar que esta corte seja desqualificada, mundialmente, como participante numa das mais cruéis e óbvias perseguições políticas dos nossos tempos”.

O critério de admissibilidade para que um caso seja submetido ao Supremo Tribunal, explica Sara, é ser de grande importância pública ou constitucional. “A perseguição política de Assange por quatro países violando sistemática e progressivamente seus direitos processuais e materiais faz do caso Assange um exemplo paradigmático de ambas as razões legais para que seja ouvido”, aponta a ativista. Ela faz referência à operação de lawfare que envolveu Suécia, Inglaterra e EUA, e que, após a troca de governo no Equador, com a substituição de Rafael Correa (o qual concedeu asilo ao jornalista) por Lenín Moreno, contou com a vergonhosa participação também desse país. Em abril de 2019, o Equador permitiu sua captura pela polícia inglesa na embaixada equatoriana em Londres, onde Assange havia se refugiado por sete anos.

“Assange foi espionado pela CIA durante seu asilo político numa embaixada estrangeira, onde teve suas conversas com advogados e médicos clonadas pela empresa de segurança da embaixada, UCL Globo, que agia como agente contratado da CIA, como ficou comprovado num processo legal em andamento em Madri”, acrescenta Sara. “Se este caso não é de interesse público ou de graves violações de direitos fundamentais, qual seria?”, questiona. “Julian Assange será extraditado para os EUA no final de julho ou em outubro, dependendo das conveniências”, vaticina ela, para quem a audiência oral na alta corte será “mera formalidade ritualística, para dar a impressão de que o procedimento legal foi seguido”.

Biden, retire as acusações!

A nova negativa judicial foi uma ducha de água fria no movimento pela libertação de Assange, que vinha crescendo. Além de maior organização no plano internacional, aumentou a pressão contra os EUA, que ganhou nitidez, por exemplo, na campanha “Biden, retire as acusações contra Assange”.

As seguidas manifestações de estadistas, como Lula e o presidente mexicano López Obrador, bem como de celebridades como Roger Waters e o ex-ministro grego Yanis Varoufakis, ajudam a evitar que o caso seja esquecido. No Brasil, a campanha ganhou apoio de dezenas de parlamentares e de artistas como Caetano Veloso e Chico Buarque. E a mudança de governo na Austrália contribuiu, desde maio de 2022, para melhorar a correlação de forças desta batalha profundamente desigual.

De um lado, o império norte-americano e seus aliados, e de outro lado um jornalista implacavelmente perseguido, enjaulado e que vinha contando somente com o apoio da família, de amigos, de entidades de jornalistas e movimentos sociais. Mas a chegada dos trabalhistas australianos ao governo trouxe consigo algumas mudanças, reportadas pelo jornal The Guardian.

O primeiro-ministro Anthony Albanese passou a se pronunciar publicamente em favor da imediata libertação de Assange; em abril, o alto comissário da Austrália no Reino Unido, Stephen Smith, visitou Assange na prisão; em maio, um grupo de membros do Parlamento avistou-se com a embaixadora dos EUA Caroline Kennedy, para pedir a suspensão do processo de extradição, e encaminhou carta de idêntico teor ao presidente Joe Biden; e até o líder da oposição, Peter Dutton, propôs o encerramento do caso contra o fundador do WikiLeaks.

Caso seja extraditado, Assange poderá ser condenado a penas que somam 175 anos de prisão, unicamente por haver revelado ao mundo, por meio do WikiLeaks, crimes de guerra e de espionagem dos EUA. Se assim for, a única certeza é que a luta por sua libertação continuará e será intensificada.