Privatização da EBC: perigo para a comunicação pública do país

Trabalhadores lutam contra o Plano Nacional de Desestatização, que põe em risco setores essenciais para o fortalecimento da democracia, do desenvolvimento nacional e da cidadania do povo brasileiro

por Eduardo Viné Boldt

O projeto de comunicação pública no Brasil está em perigo. Os ataques promovidos pelo governo Bolsonaro contra as estatais alcançaram a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) com a sua inclusão no Plano Nacional de Desestatização (PND). Os decretos foram publicados no Diário Oficial da União no dia 9 de abril. Com isso, o governo federal está a uma “canetada” de enterrar um projeto que, a duras penas, tem sido construído nos últimos 90 anos.

Extinguir a EBC foi promessa de campanha do presidente, que buscava acenar aos conglomerados de comunicação e ao setor financeiro com uma agenda de reformas e privatizações. A empresa, que tem sedes em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, sofre ataques desde a sua fundação, no final de 2007, por exercer “concorrência” em um setor caracterizado pelo monopólio. Ataques que muitas vezes se utilizam de informações falsas e dados distorcidos.
Luta contra a privatização

Com o avanço do processo de privatização, os empregados e entidades representativas se articularam em diversas frentes, como no Congresso Nacional, para tentar impedir mais esse desmonte. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e os sindicatos de jornalistas e radialistas se reuniram no início de maio com Martha Seillier, secretária especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo federal.

Segundo a secretária, sua equipe pretende lançar nos próximos meses edital para contratação de consultoria, com
o objetivo de avaliar a necessidade da existência da estatal e definir a forma de desestatização da empresa. Martha se comprometeu a abrir espaço para as entidades mas, apesar da aparente cordialidade, afirmou que, caso os técnicos apontem para a essencialidade da comunicação pública, pode haver concessão à iniciativa privada.

Esse modelo de concessão já é majoritário no setor de comunicação brasileiro, o que hoje provoca uma “hipertrofia” dos grandes conglomerados de comunicação. “A comunicação, bem como outros bens culturais, tem que estar a serviço da população e não condicionada à venda de publicidade, como hoje vemos majoritariamente nas concessões” afirma Maria José Braga, presidenta da Fenaj.

Comunicação pública
A criação da empresa em 2007 cumpriu determinação prevista na Constituição federal. Além disso, empresas públicas de comunicação são estratégicas e estão presentes por todo o mundo. “A comunicação pública existe em todos os países e é necessária para garantir informações que não são nem as institucionais do governo nem as de emissoras que visam o lucro. No Brasil ela vem desde a década de 1930 com a Rádio MEC, passa pela criação das TVs educativas e da Radiobrás e tem como pontos altos a previsão do sistema público no artigo 223 da Constituição e a Lei 11.652, que regulamenta o sistema público no Executivo federal e cria a EBC”, afirma Jonas Valente, empregado da EBC e pesquisador associado do Laboratório de Políticas de Comunicação (Lapcom) na Universidade de Brasília (UnB).

O desmonte do caráter público da estatal já está em curso, desde 2016, com o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Sob o argumento de contenção de gastos, a EBC sofre críticas por não dar “lucro” e ter pouca audiência em sua emissora de televisão, a TV Brasil. Isso apesar de a emissora chegar a 7º lugar em audiência no país. “A gente reforça que a EBC é uma empresa que produz informação e conteúdo para sete emissoras de rádio, dois canais de televisão, duas agências de notícias”, esclarece Daniel Ito, diretor do Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal. “Se utilizarmos os recursos do fundo que foi criado junto com a EBC [CRFP – Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública] – hoje ele está em torno de um bilhão e meio de reais –, só esse dinheiro é capaz de sustentar a EBC por três anos sem um centavo a mais do governo federal”, conclui.

A Empresa Brasil de Comunicação oferece um serviço que alcança milhões de brasileiros direta ou indiretamente. Seja por jornais, revistas, rádios e emissoras de televisão que reproduzem o conteúdo produzido pelos trabalhadores das suas agências, seja pelas frequências emitidas pela estatal. Chega a territórios onde não há outros veículos noticiosos. Através desses conteúdos, o direito à informação é garantido a uma parcela significativa
de cidadãos brasileiros.

Para o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, essa luta se inscreve num combate com o conjunto dos trabalhadores, contra a liquidação do patrimônio estratégico do povo brasileiro. A luta é contra o próprio Plano Nacional de Desestatização, em defesa dos Correios, da Caixa Econômica Federal, da Eletrobras e da Empresa Brasil de Comunicação.