Memória: Dermi Azevedo, defensor dos direitos humanos

por Cláudio Soares

Ficha de Dermi Azevedo no Dops, quando da prisão que sofreu em 1974, por sua luta contra a ditadura militar / Foto: REPRODUÇÃO

Referência nacional no movimento pelos direitos humanos, o jornalis­ta e cientista político Dermi Aze­vedo faleceu em 1º de setembro de 2021, aos 72 anos. Sua vida foi marca­da por décadas de atividade profissional e militante em defesa dos mais humildes e explorados. Diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) em duas gestões (1991-1994 e 1997-2000), ocupou na segunda o cargo de secretário-geral da entidade.

Dermi nasceu em 4 de março de 1949 em Jardim do Seridó, no Rio Grande do Norte, e foi criado em Currais Novos, no mesmo estado. Estudou Jornalismo na Universi­dade Federal do Rio Grande do Norte e, posteriormente, fez Mestrado e Doutorado em Ciência Política na USP. Na época de graduação, participante da luta contra a ditadura, foi preso em 1968 no congresso de Ibiúna da União Nacional dos Estudantes (UNE). Por sua atividade militante, teve de exilar-se no início da década de 1970.

Após retornar ao Brasil, sofreu novas perseguições. Em 1974, foi preso, junta­mente com sua companheira na época, Darcy Andozia. Essa prisão foi marcada por um dos atos mais bárbaros cometi­dos por agentes da ditadura: seu filho pri­mogênito, Carlos Alexandre Azevedo (o Cacá), um bebê de apenas um ano e oito meses, foi levado por policiais da equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury e so­freu torturas. A violência o marcou para sempre – Cacá desenvolveu fobia social e, em 2013, aos 40 anos de idade, suicidou-se.

Numa carta dirigida ao filho morto, Der­mi escreveu: “Definitivamente marcado pela dor… por sua dor e pelo sofrimento (inenarrável) de sua mãe e de seus irmãos, você decidiu partir. Cabe a mim, seu pai, a tarefa quase apenas de compartilhar a narração do seu calvário, de denunciar – como jornalista – os crimes da ditadura e de lutar para que dores e agonias, como as que você viveu, nunca mais aconteçam…”

A dor profunda que o episódio causou não impediu que Dermi permanecesse, até o fim da vida, um homem bem-humo­rado, sereno e de modos tranquilos, que fez amigos por onde passou. No início da década de 1980, com Leonardo Boff, foi um dos fundadores do Movimento Nacional de Direitos Humanos.

Ao lado dessa atuação política, Dermi desenvolveu intensa atividade jornalísti­ca, realizando reportagens em países da América Latina, África e Europa. Dentre os veículos nos quais atuou, podem ser citados: Tribuna do Norte, Diário de Na­tal, Última Hora (São Paulo), Folha de S. Paulo, Jornal da Tarde, Veja, Isto É, Diário do Grande ABC e Aqui São Paulo. A par­tir de 1995, exerceu cargos de confiança no Governo do Estado de São Paulo. Foi editor-chefe do Diário Oficial do Estado, assessor técnico na Secretaria da Justiça e da Defesa e Cidadania e gerente de for­mação da Fundação Instituto de Terras do Estado de São de Paulo (Itesp).

Era casado desde 2011 com a pedagoga Elis Regina Almeida Azevedo. Acometido da doença de Parkinson há alguns anos, não deixou que as limitações trazidas por essa condição interrompessem os cursos que proferia e os textos que escrevia. Seu último livro, Nenhum Direito a Menos: Direitos Humanos – Teoria e Prática, foi lançado em 2018. Vinculado por muito tempo à Igreja Católica, tornou-se depois membro da Igreja Anglicana. A trajetória de Dermi foi abordada no curta-metragem Atordoado, Eu Permaneço Atento (2020), dirigido por Henrique Amud e Lucas H. Rossi dos Santos.

Morreu, em São Paulo, após sofrer in­farto. Seu corpo foi velado no Auditório Vladimir Herzog, do nosso Sindicato, por onde passaram muitos de seus amigos e colegas jornalistas, políticos, religiosos e ativistas da luta por direitos humanos.