Editorial: Enfim, a esperança

ATÉ NUNCA MAIS, JAIR BOLSONARO!
De alma lavada e com a promessa devidamente cumprida (quem leu o editorial passado sabe do que estamos falando), chegamos à última edição do Unidade neste ano. E é bem provável, querida leitora e querido leitor, que você esteja chegando ao final deste 2022 tão exausto e esgotado quanto nós estamos. Mas é indescritível poder escrever este editorial e falar sobre futuro e esperança. Duas palavras que começam a ser resgatadas para nosso vocabulário após anos de retrocessos, autoritarismo e obscurantismo. Mas também de muita luta e resistência.

Inicialmente, esta edição tinha previsão de publicação para o início de novembro. Mas decidimos estender um pouquinho mais o fechamento por uma ótima causa: após o resultado das eleições do dia 30 de outubro, queríamos discutir quais são as perspectivas que se abrem para a nossa categoria e para o jornalismo a partir de 2023. Sabemos bem que a partir de 1º de janeiro o Brasil não estará com todos os seus problemas magicamente resolvidos, que veremos a paz e a concórdia entre nosso povo ou que nossos salários se multiplicarão. Muito pelo contrário: é provável que o próximo período seja repleto de dificuldades, desafios e contradições. É inegável afirmar, entretanto, que uma outra possibilidade de país foi resgatada com a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva. A começar pelo respeito ao trabalho jornalístico e à democracia.

Nos últimos meses, nosso trabalho sindical — que já não é a coisa mais tranquila do mundo — foi potencializado por alguns fatores diante da escalada de violência, ameaças e ataques aos jornalistas. E, felizmente, não nos contentamos em produzir apenas as famigeradas notas de repúdio em solidariedade a cada colega que era impedido de exercer sua profissão por conta do ódio político incentivado pela máquina bolsonarista de mentiras e violência. Além de contatar as e os jornalistas e oferecer apoio jurídico e trabalhista, nos somamos às diferentes entidades jornalísticas do Brasil para levantar publicamente nossa voz em defesa da democracia e do jornalismo. No último dia 27 de setembro, organizamos um ato na PUC São Paulo que contou com depoimentos de diferentes jornalistas (todas elas mulheres), relatando o verdadeiro pesadelo de exercer o jornalismo profissional em tempos de obscurantismo. Em um documento unificado, 17 entidades declararam: “Nós resistimos e resistiremos. Seguiremos cumprindo nosso dever de levar informações de interesse público para toda a sociedade, com ética jornalística e profissionalismo. E temos certeza de que o medo, o ódio e a violência não vencerão. Viva a democracia, o povo brasileiro e a luta de cada jornalista deste país!”.

Menos de um mês após a realização deste ato, no dia 25 de outubro, também participamos da organização do Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, que foi criado por este Sindicato e hoje é considerado a principal premiação jornalística do Brasil — principalmente pelo fato de que é a própria categoria que reconhece os trabalhos merecedores da distinção. Após dois anos de eventos virtuais, a cerimônia de premiação voltou a ocorrer de maneira presencial, no Teatro Tucarena, que tem sua história marcada pela resistência à ditadura e ao autoritarismo. Assim como a própria data da cerimônia, que relembra os 47 anos do assassinato de Vladimir Herzog pela ditadura brasileira. Às vésperas do segundo turno, o evento foi marcado por momentos emocionantes, como a homenagem póstuma ao jornalista Dom Philips — um dos mais tristes símbolos da barbárie que se abateu em nosso país e especialmente nos territórios amazônicos — e o reconhecimento às trabalhadoras e aos trabalhadores da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que receberam um dos prêmios especiais da noite por sua resistência diante das tentativas de desmonte e destruição da comunicação pública nos últimos anos.

FENAJ ENTREGOU AO PRESIDENTE LULA AS NOSSAS PAUTAS PRIORITÁRIAS, ENTRE AS QUAIS A APROVAÇÃO DA PEC DO DIPLOMA E A CRIAÇÃO DO PISO NACIONAL DOS JORNALISTAS

Mas, como falávamos no início, a partir de agora contamos ao menos com o direito de ter esperança e construir uma realidade mais justa e democrática, especialmente para a nossa categoria. E é por conta disso que a entrevistada desta edição do Unidade é Eliane Gonçalves, jornalista da EBC e uma das integrantes da Comissão de Ética de nosso Sindicato, que discute quais são as potencialidades e desafios da comunicação pública no novo governo. Além disso, nossa reportagem de capa entrevista colegas jornalistas de diferentes entidades para avaliar os horizontes da comunicação e do jornalismo a partir do próximo ano.
A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) já entregou ao presidente Lula um documento com as pautas prioritárias de nossa categoria, entre as quais a aprovação da PEC do Diploma, a criação do Piso Nacional dos Jornalistas, a taxação e regulação das plataformas digitais, a democratização das comunicações e a ampliação do sistema público de comunicação no Brasil. Como vocês podem notar, não será fácil e teremos muita luta pela frente. Mas em condições muito mais dignas, para dizer o mínimo…

E a luta continua!
Bem que gostaríamos de encerrar este editorial apenas com as boas novas, mas a verdade é que se no plano federal a nossa categoria contará com certa esperança para avançar na conquista de direitos, a coisa não será nada fácil em São Paulo. Tudo bem que já adquirimos certa experiência em lutar contra desmontes e arbitrariedades diversas durante os 28 anos de governos tucanos, mas agora a nossa batalha será travada diretamente com o bolsonarismo, só que em uma versão estadual.

Isso é particularmente preocupante ao se levar em conta que o desastre da gestão da EBC nos últimos anos pode ser replicado para a TV Cultura e demais meios públicos de comunicação de São Paulo. Além do fato de que o resgate da Imprensa Oficial do Estado ficará muito mais distante de ser concretizado diante das explícitas ambições privatistas e de destruição dos bens construídos pelo povo.

Mas não adianta ficar chorando pelo leite derramado. Agora, é curtir o merecido descanso neste final de 2022 — mas sempre atentos, é claro, para combater qualquer tipo de sanha golpista que ainda tente impedir o processo democrático em nosso país. E chegar com a energia devidamente carregada para construir um Brasil justo e que tenha a classe trabalhadora como protagonista na luta por direitos e dignidade. Ousemos sonhar!

Direção do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo